Era uma vez um moço trabalhador e honesto que morava com sua mãe. Viviam com muita dificuldade, quase não tendo bem o que comer.
Um dia disse à mãe que não podiam continuar vivendo daquele jeito. Pediu sua benção e saiu pelo mundo para ver o que conseguia fazer.
A mãe abençoou-o e ele se foi. Onde chegava, trabalhava uma semana e seguia adiante. Tempos depois chegou em um reino bonito, mas sem gente. As ruas limpas de povo, as casas fechadas, tudo calado, sem um choro de menino ou voz de homem, parecia um descampado.
O rapaz procurou uma casinha, bateu à porta e pediu comida. O velho, que lá morava, recebeu-o muito bem. Quando estavam comendo o rapaz perguntou porque o reinado era assim tão triste. O velho explicou que, por mal dos pecados do povo, aparecera ali um homem encantado, de nome Dom Lobo, dono de um palácio, que comia o coração de uma pessoa a cada dia.
"Pega a criatura e faz três perguntas. Se a criatura responder, pode fazer outras três a Dom Lobo, mas não nasceu ainda esse cristão para adivinhar as perguntas de Dom Lobo. Não responde e Dom Lobo mata e come o coração dos pobres. Por isso é que toda a gente vive escondida e tremendo de medo."
O rapaz dormiu e na manhã do outro dia saiu pra a rua perguntando onde era o palácio de Dom Lobo. O povo ficava espantado com o atrevimento dele, mas ensinava. O moço chegou perto de umas pedras grandes e lá em cima estava o palácio, que era enorme, com um portão de ferro.
Chegou, bateu, as portas se abriram sozinhas. O moço entrou, sobe aqui, desce ali, até que chegou num salão que era uma beleza. Apareceu Dom Lobo, um homem alto, forte como um touro, todo cabeludo, com olhos de gato e uns dentes de onça-tigre. Quando viu o rapaz deu uma gargalhada estrondosa. Falou, com voz grossa de bicho encantado, mandando o rapaz sentar. Depois perguntou:
- Que é que quanto mais velho mais fote fica?
- É o vinho - respondeu o moço.
- Que é que tanto se tira mais fica?
- Água do mar!
- Qual é o lugar aonde todos vão e ninguém quer ir?
- O cemitério!
- Acertou, cabra danado! Faça as três perguntas que quiser!
- Quem é que nasceu de uma virgem, batizou-se num rio e morreu numa cruz?
Dom Lobo rangeu os dentes como um desesperado porque não podia dizer o santo nome de Jesus Cristo. Deu um estouro que estremeceu tudo e subiu aquela bola de fumaça cobrindo o mundo.
Quando clareou, o rapaz estava em cima das pedras. O palácio e Dom Lobo tinham sumido. O povo estava todo reunido batendo palmas e levou o moço para o rei. Deram uma casa, fazenda de gado e muito dinheiro. O rapaz mandou carruagem para buscar sua mãe e viveu muito bem e satisfeito.
Este conto popular brasileiro foi recolhido por Câmara Cascudo junto a uma empregada chamada Antonia, nascida no Piauí e está no livro "Contos Tradicionais do Brasil". Traz a tradição das perguntas enigmáticas que vive em toda parte do mundo. Muitas histórias européias têm esse assunto, entidades encantadas, que se livram do encantamento ouvindo a resposta a três perguntas. Neste caso, o Diabo não podia responder à pergunta.
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